Para onde vão as ACervAs? – A união possível

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* Nota do Editor: Este post é a “continuação” dos artigos Para onde vão as ACervAs? e Para onde vão as ACervAs? – Sobre hobbys e profissões, publicados neste espaço em 6/1 e 8/1, respectivamente. Para melhor entendê-lo, recomenda-se a prévia leitura dos dois textos já citados, bem como dos seus comentários.

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LeoSewald

Por Leonardo Sewald *

Me senti na obrigação de tecer alguns comentários nessa discussão simplesmente sensacional. O post do Mauricio deu início a um debate saudável que é de extrema importância para o sucesso da história cervejeira do país. Vou tentar “engrandecer” a discussão e colocar aqui uma humilde mensagem para todos que se envolvem no meio cervejeiro, sejam homebrewers, sommeliers, blogueiros, jornalistas, cervejeiros, profissionais do mercado, etc.

A palavra-chave é: união. União, pois juntos somos mais fortes, juntos temos mais força política, juntos temos mais poder de transformação, juntos fazemos mais cerveja, juntos a festa fica melhor e tem mais carne no churrasco. Pode parecer um discurso populista, mas em uma nação pequena como a nossa (a nação cervejeira), a união faz a diferença. O sucesso das ACervas é prova de que união de grupos com interesses comuns dá certo.

Pois bem, estamos falando do futuro das ACervas. Como membro fundador de uma delas, posso dizer com alegria que acompanhei e participei de muitas transformações dessa grande comunidade cervejeira, e pretendo participar de muitas outras que acontecerão no futuro. Uma delas, que parece o natural próximo estágio do desenvolvimento de tal sociedade, é a união das ACervas e a formação de uma entidade nacional. Isso vai acontecer. É uma questão de tempo e de organização. As ACervas estão brilhando no nosso país, e isso é mérito do trabalho dos sócios envolvidos.

Transformando hobby em profissão

Como já sabem, desde o ano passado, resolvi perseguir aquele que é o sonho de quase todo o homebrewer: o de montar a sua própria microcervejaria artesanal, tranformando o hobby em profissão. No ano passado, nasceu a Seasons Craft Brewery em Porto Alegre, uma das melhores coisas que fiz na minha vida. Fiz porque acredito no crescimento do mercado, acredito que os valores que esta comunidade está construindo são louváveis e que o Brasil precisa de mais cerveja artesanal, para podermos transformar a cara do cenário cervejeiro do nosso país.

Muito se fala sobre o cenário brasileiro ser similar ao dos EUA. Eu mesmo sou um que dissemina esse pensamento, após ter visto com meus próprios olhos o que acontece por lá. Mas ser similar não quer dizer ser igual. Cada país tem os seus problemas, suas dificuldades e, principalmente, o seu povo. Por ter estudado bastante o mercado americano antes de abrir a cervejaria, encontrei algumas peculiaridades:

  • A Brewers Association (BA), entidade que reúne profissionais e entusiastas do mercado cervejeiro, teve suas origens como a união entre duas entidades distintas: uma, a Brewers Association of America, entidade formada lá pelos anos 40 e que reunia exclusivamente profissionais da área; a outra, a Association of Brewers, entidade que reunia, entre outros grupos, a American Homebrewers Association (AHA – sim, aquela mesmo, do Charlie Papazian, que era só de homebrewers). Para eles, fez mais sentido juntar os grupos enquanto os mesmos ainda fossem pequenos, mesmo que um desses grupos tivesse interesses comerciais e o outro não.
  • Até 1978, fazer cerveja em casa era proibido nos EUA. Existiam apenas alguns poucos grupos isolados (um deles, o Maltose Falcons), mas o movimento homebrewing americano foi ganhar real força só depois desta data. Nessa época, a revolução das craft breweries já estava em andamento, em parte por causa da lógica: “se não dá pra fazer em casa, então vou abrir uma empresa e fazer comercialmente!”
  • Houve ajuda mútua entre os craft brewers e homebrewers. Em parte porque as associações de classes do mercado cervejeiro e as associações de homebrewers estavam unidas (através da Brewers Association), mas especialmente porque os homebrewers estavam legalmente limitados e os craft brewers enxergaram no cenário homebrewer um potencial de transformação.

Aqui no Brasil a história é similar, mas não é igual. Na verdade, está do avesso: temos uma comunidade homebrewer crescendo exponencialmente, esplendorosamente livre pra fazer o que bem entender, sem obrigações legais, que está “de vento em popa”. A comunidade de cervejarias, por outro lado, ainda está escorregando, apesar de também estar crescendo. Os principais interesses desses dois grupos são os mesmos, a exceção fica pela questão da vendagem, exclusiva das microcervejarias.

Dá pra juntar todo mundo!

Onde quero chegar com isso? Como frisei antes, a união faz a força (e também o açúcar!), então por que não juntar esses grupos? Um fortalece o outro, que é o que todos queremos ver. Mais uma vez, a exemplo do que fizeram os americanos com a AHA e a BA, é mais fácil unir os pequenos grupos (no caso, os homebrewers e os craft brewers) para que, juntos, tenham mais expressão, do que travar duas batalhas em fronts separados com um contingente menor.

Como exemplo, passo a minha realidade. Quando criei a Seasons, senti na pele os problemas de se abrir uma empresa do ramo no Brasil. A transição de homebrewer para profissional, que poderia (e deveria) ser mais suave e natural foi difícil. Por vezes, foi como se estivesse andando às cegas. Eu incentivo a todos que conheço a tomarem propriedade de seus respectivos narizes e abrirem seu próprio negócio, especialmente se tiver a ver com cerveja, aí aproveito e ajudo com toda informação que tenho. Mas isso não é suficiente. O que devemos tirar de tudo isso é que precisamos criar meios para que tais dificuldades não sejam impostas aos próximos que desejam fazer o mesmo que fiz.

De quem é esse trabalho? Certamente não é só da Seasons, nem só da Falke ou da Colorado, ou da Bamberg e da Junka Beer; não é também só das ACervas. Esse é um trabalho que toda a comunidade cervejeira brasileira precisa fazer! Que levante a mão aquele que, após fazer suas primeiras receitas de cerveja de sucesso, não pensou em fazer desse hobby um meio de vida. Conheço bastante gente que até tentou, mas parou no meio do caminho por ser muito complicado, ou ainda por ser muito caro, ou por ter muito imposto, enfim, motivos não faltam. Quanto mais ajuda esse pessoal interessado receber, mais adiante seus sonhos se transformarão em realidade e mais cervejarias nós vamos ver por aí.

As ACervas, como são hoje, também saem ganhando: com cervejarias parceiras, há mais apoio, mais incentivo, mais patrocínio, mais aprendizado e, sobretudo, mais cerveja!

Fica a mensagem: união dos povos, sob uma bandeira comum: a da cerveja artesanal. Abraços a todos.

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* Leonardo Sewald, cervejeiro, é sócio-fundador e hoje membro do conselho da ACervA Gaúcha.

3 Respostas para “Para onde vão as ACervAs? – A união possível”


  • 1 André Junqueira

    Sábias palavras!

    Apenas com a união vamos conseguir batalhar contra os entraves legais e tributários, frutos de uma regulamentação manchada de lobbys, no mínimo excusos, e total descaso pelo empreendedor do ramo cervejeiro.

    A ACervA-PR sempre apostou na parceria entre associação e micro-cervejarias, e lhes garanto que os frutos são excelentes! Não importa o tamanho da panela, mas sim a paixão pelo que se faz.

    Precisamos agora elevar ainda mais nossas pretenções para obter vitórias também nos aspectos que dificultam a sobrevivência do ramo de cervejarias independentes.

    André Junqueira
    ACervA-PR

  • Leonardo,

    Concordo 100% com voce, acho que a união deve ser entre todos os que tiverem bem intensão com a cerveja artesanal, pessoas que estão disseminando informações que venham a acrescentar, verdadeiras, pessoas que buscam resgatar a tradição, ou fazer a inovação, sejam eles cervejeiros profissionais, caseiros, jornalistas, donos de bares, ponto de vendas, fornecedores de insumos, materia-primas, ou seja, todos que trabalham neste meio porque gostam, antes de pensar no dinheiro.

    Abraço.

  • Lindas palavras. O caminho é esse mesmo, pensar no próximo como um filho e tentar facilitar ao máximo para ele, pensando prioritariamente na paixão de se fazer a cerveja, querer fazer para ter é perder tempo.

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