Quando se lê “old ale” no rótulo, em geral se espera já um caráter mais fechado, austero e até rústico, mas este excelente exemplar alia a enorme complexidade do estilo com uma grande maciez de maltes ingleses e um notável frescor que advém da generosa lupulagem feita com varietais norte-americanas (Cascade é usado em dry-hopping na receita). Europa e América se dão as mãos e, embora nem sempre a história reforce isso, aqui o casamento é pura harmonia. A coloração é castanha clara, com reflexos alaranjados, com boa transparência e um creme denso e persistente que marca as laterais do copo. O aroma começa com um soco de frescor floral e cítrico de lúpulo, com notas marcantes de lavanda e gerânios (lembra até a sensação de entrar em um cômodo recém-limpo com desinfetante perfumado) complementadas por cítricos remetendo a limão e grapefruit e um toque picante e perfumado, lembrando gengibre e trazendo algum mistério. Ésteres trazem sensações sólidas de frutas, com destaque para mamão papaya, banana caramelada e uvas passas. O malte mostra todo o seu caráter e profundidade na boca, com caramelo, mel, avelãs, castanhas e até uma sugestão de doce de leite, tudo bem macio. Ao fundo, talvez um toque abanilhado de diacetil reforça a maciez do conjunto. No geral, o aroma é mais complexo e avassalador do que o paladar, o que eleva sua drinkability sem tirar-lhe o caráter. Doce e amargo se equilibram bem na boca, com um leve destaque para o amargor que persiste na garganta depois que o doce já se dissipou. O corpo fica entre mediano e leve, relativamente bem atenuado, com uma excelente textura de seda. A carbonatação é baixa, o que ressalta ainda mais a maciez do conjunto, e o álcool se faz pouco evidente diante do equilíbrio do paladar e da intensidade de aromas. É verdade que se trata de um estilo que eu aprecio bastante, mas este rótulo realmente me impressionou e revelou-se além das expectativas. Muito complexa e aromática, com grande presença de maltes, lúpulos e levedura numa ótima composição que preza pela maciez. Custo-benefício muito bom, a meu ver. Prova vívida de que é possível atingir efeitos extraordinários dentro de estilos estabelecidos, com variações que parecem pequenas mas alteram toda a impressão geral, como é o caso do uso de lúpulos americanos para dar aroma a esta cerveja inglesa.