Com esta obra-prima virtuosa, elegante e inebriantemente perfumada, a cervejaria Bosteels nos dá uma aula sobre como uma cerveja pode ser equilibrada, alegre e de paladar acessível, sem excessos, e ao mesmo tempo sem perder nada de seu interesse e complexidade para o paladar mais exigente. Apesar de o rótulo remeter à simplicidade da vida monástica, eu me imagino perfeitamente brindando com esta cerveja em uma celebração na mais elegante corte num luxuoso palácio, junto com uma multidão de convivas alegres e despreocupados. Despejada na taça, ele mostra um bonito dourado radioso, com delicada opacidade, e forma um creme branco espantosamente volumoso e muito persistente, fofo, deixando aqueles “relevos” na superfície e a renda belga na taça. Suponho que as proteínas do trigo usado na receita tenham algo a ver com isso. O aroma é um perfume intenso: predomina uma aguda e sofisticada combinação do cítrico-condimentado das sementes de coentro com um perfume de rosas. Em segundo plano, notas frutadas remetem a maçãs vermelhas e laranja, e o lúpulo começa a aparecer com o tempo mostrando um refinado perfil floral, cítrico (limão) e sutilmente apimentado. Os cereais da receita (cevada, trigo e aveia, os três maltados e não-maltados) aparecem de forma sutil no aroma, mas tornam-se mais evidentes na boca com notas de mel sólidas e uma leve sensação abaunilhada. Também as maçãs vermelhas se pronunciam mais na boca, juntando-se ao malte para dar uma sensação de torta de maçã e creme. Equilibrada, ela tem uma primeira impressão doce na boca, mas essa doçura alegre e acalentadora é corretamente equilibrada por um final mais amargo e seco, na medida, que deixa na boca um perfume de rosas e mel. A acidez é relevante, mas não protagonista. A sensação na boca é excelente, com uma textura sedosa advinda do uso da aveia, dando a impressão de “derreter” na boca e convidando o bebedor a uma plácida e irresistível rendição. Ao final da garrafa, deixa a impressão saudosa de que um pouco da beleza, do brilho e da alegria do mundo se acabaram no copo vazio. Agudamente perfumada, com sensações frutadas e adocicadas e reconfortante sensação na boca, ela é sempre uma aula de harmonia e sutileza para o apreciador de cervejas; para o leigo, além disso, oferece uma bebida de paladar acessível e equilibrado, mostrando que uma coisa não precisa excluir a outra. Um brinde!