Quando ouvi que "Nora" era a ex-mulher do mestre cervejeiro Teo Musso, fiquei até um pouco desconfiado - mas logo me esclareceram que, à época da elaboração da receita, eles ainda estavam casados, de modo que a homenagem passou a soar mais, digamos, auspiciosa. Trata-se de uma cerveja indicada como "cerveja egípcia" devido ao emprego de um cereal egípcio (o kamut), além de gengibre e mirra. O resultado final lembra muito uma Belgian blond ale, frutada, maltada e com um sutil perfume floral e de especiarias. Na taça, mostrou-se dourada escura, com uma opacidade mediana e um creme de baixo volume e pouca persistência. O aroma mostra bom equilíbrio entre malte, lúpulo e levedura, com destaque para a última. Predomina um aroma frutado de ésteres, remetendo a abacaxis em calda, acompanhado de um lúpulo com características florais (gerânio) e cítricas (limão) e de um malte adocicado lembrando mel. Seria bastante agradável, apesar de pouco complexo, se não tivesse sido prejudicado pela presença razoavelmente intensa de ácido caprílico, lembrando sabão em barras, que com o tempo começa a dominar o conjunto e ofuscar as demais características. O sabor possui maior complexidade e sutileza, pois nele se sentem os toques das especiarias da receita, ainda que de forma sutil. Ésteres (abacaxi) e malte (mel e pão doce) predominam, com a adição de um floral de rosas e toques cítricos do lúpulo. As especiarias - mirra e gengibre - são usados "à moda belga", ou seja, de forma sutilmente perceptível, mas não evidente. Eu não teria identificado o que é se já não soubesse, mas é possível, sim, sentir um leve perfume de fundo da mirra e uma suave picância do gengibre. O paladar é bem adocicado, um pouco desequilibrado para o meu gosto - como as demais Baladin, por sinal -, com acidez mediana na entrada, um amargor baixo durante toda a evolução e uma suave picância na finalização, conduzindo a um final doce com retrogosto um tanto curto e chapado de mel e um sabor residual estranho na boca, possivelmente devido ao ácido caprílico. O corpo é mediano, com textura cremosa (será pela adição do kamut?), e o álcool se faz perceber de forma suave, bem-inserido. No conjunto, pode ser considerada uma interessante cerveja com o perfil de uma Belgian blond ale, na qual o malte e os ésteres frutados são bem complementados por uma adição discreta de especiarias. Não espere sentir o gosto da mirra e do gengibre de forma evidente; esta cerveja tem uma criatividade mais sutil, com um suave perfume "oriental" mais sugerido do que enfaticamente evidenciado. Seus maiores problemas, a meu ver, foram a doçura um pouco destacada demais (para o meu gosto) e a presença mais intensa do que deveria do ácido caprílico, que lhe tirou o brilho do aroma e a vividez do sabor.