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Em busca do duende Chouffe – Parte 2

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Antes de deliciar-se com a parte final da aventura descrita abaixo, vivida pelo leitor do BREJAS Evandro Domingues na viagem que fez à cervejaria belga Achouffe, leia a primeira parte AQUI.

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Quando chego à “cidade”, pouco antes do meio-dia, percebo que esta se limita à cervejaria e a uma capela de São José. Em Achouffe residem 65 almas, sendo 18 dedicadas ao fabrico da nobre bebida. Justo neste dia, uma segunda-feira, não havia visita guiada propriamente dita, mas eu já combinara com o guia, por telefone, que ele me mostraria algumas partes da cervejaria em off. Assim, quando chego, vou à loja e pergunto por ele, que estava no restaurante. Tão logo me identifico (“the guy from Brazil”), ele me aponta um senhor e pergunta, misturando inglês e francês: “Sabe quem é aquele lá?” À minha negativa, responde: “O criador da Hoeggarden…”. Ele, em pessoa, tomando calmamente sua La Chouffe. A emoção é grande. Depois de visitar a cervejaria, sento no restaurante e começo por uma La Chouffe, logo secundada pela McChouffe (a escura, também não-filtrada e com refermentação na garrafa). Depois, novidade para mim, peço uma N’Ice Chouffe, uma saison escura, especial de inverno, condimentada com tomilho e curaçao, que chega aos 10%. Tudo da torneirinha. Para petiscar, Patachouffe, o queijo que, naturalmente, também leva cerveja.

Pinto no lixo, escrevo no diário: “Devo me beliscar. E depois abrir os olhos. Estarei sonhando. Estou. La vida es sueño & this is a dream come true.”

Almoço um pintadeau (espécie de galinha-da-angola) feito com McChouffe, e arremato tudo com um cálice de Esprit d’Achouffe, um destilado de cerveja (“eau de vie”), envelhecido por cinco anos. Mal contendo a excitação, passo depois na loja, onde compro camisa, placa e ainda ganho alguns brindes (chaveiro e cartões). De quebra, o dono da loja me oferece uma carona a Gouvy, com direito a uma espiada no depósito em Houffalize.

Assim termina a visita. De Gouvy, trem para Liège e, então, para Bruxelas. Nesta noite, ainda dou um pulo no Mort Subite e no La Becasse. Mas isso já serão outras histórias.

Assim termina a visita, mas não termina o relato. Relendo anotações do que escrevi, em êxtase, no restaurante da cervejaria, encontro este trecho: “Mas sinto saudades daquela menina, apesar dos eventuais, e normais, arranca-rabos. Ontem até combinamos COMO NUNCA ter filho. Mas ela estava meio excitada pelo vinho, então prefiro falar disso depois… Mas é o que MAIS QUERO hoje… Uma Laurinha.”

Em 2005 iríamos completar 12 anos juntos e, como se percebe, não tínhamos ainda filhos. Este só veio agora, há pouco mais de 1 mês. Não uma Laurinha, mas o Dante. Quem sabe, então, não é hora de voltar à Achouffe para batizá-lo naquela igrejinha de São José (Dante nasceu dia 19…), em meio aos duendes das Ardennes? Hummm, ainda mais agora que descobri que a cervejaria pôs no mercado uma novidade: a Houblon Chouffe, uma IPA feita com três tipos de lúpulo… Até concordaria em, desta vez, pagar os 50 euros de táxi… Mas, para não ter que pagar a volta, quem sabe então os 65 habitantes de Achouffe não passam a ser 68?

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Domingues e seu troféu

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VEJA TAMBÉM:

Westvleteren: Indo à fonte da cerveja mítica.

Viagem e Cerveja: As histórias e peregrinações dos Confrades do BREJAS em busca da “cerveja perfeita”.

Em busca do duende Chouffe – Parte 1

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O texto abaixo foi enviado por Evandro Domingues, fiel leitor do BREJAS e, como nós, fascinado por cervejas e viagens. Domingues conta a peregrinação que fez, na Bélgica, em busca de uma das suas brejas prediletas. Boa leitura — e boa “viagem”!

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Quando fundaram, por hobby, a cervejaria belga d’Achouffe em 1982, os cunhados Pierre Gobron e Christian Bauweraerts não tinham ambições além do entretenimento. Dois anos depois a coisa ficou mais séria, e Gobron decidiu abandonar seu emprego para se concentrar apenas na cervejaria, o mesmo fazendo Bauweraerts um pouco depois. Eles sabiam o que faziam. La Chouffe (8%), o carro-chefe da casa, é uma cerveja não-filtrada, turva, que passa por uma refermentação na garrafa e no barril. Bastante frutada e lupulada, é uma cerveja espetacular.

Antes de prosseguir: a cerveja se chama La Chouffe; a cervejaria, Brasserie d’Achouffe; a cidade, Achouffe, e o duende que deu origem a tudo se chama… Chouffe. O que veio primeiro? Naturalmente, o nome do malicioso anãozinho que, abundante nas florestas das Ardennes, emprestou o nome à pequenina vila. O nome da cerveja nada mais é que um trocadilho com o nome da vila. Entenderam? Achouffe! Saúde!

Não me lembrava quando ou como eu sucumbira aos feitiços do duende. Recorrendo a velhos diários, consigo localizar com precisão o dia em que tomei a cerveja pela vez primeira: 19 de julho de 1998, no Café Belgique, em Amsterdam. Depois de tomar uma La Trappe, pedi, aceitando sugestão do menu, uma das “Belgian favorites” e assim a descrevi: “fuzzy, strong, delicious”. Foi paixão ao primeiro gole. Paixão fortalecida nesta mesma viagem, quando segui para Bélgica, e cinco anos depois, quando, em Bruxelas, no Bier Circus, sem dúvida um dos meus bares mais queridos e onde quero que repouse ao menos um punhado das minhas cinzas, sempre terminava ou iniciava minhas descobertas por uma La Chouffe.

Mas foi só em 2005, na minha terceira visita à Bélgica, que encetei uma peregrinação à fábrica do duende. Visitar fábricas de cervejas que amamos é um dever como o que os muçulmanos têm em relação a Meca: pelo menos uma vez na vida, devemos ir lá, conhecer de perto, sentir o ambiente, aspirar os cheiros e, claro, beber da cerveja fresca, direto da teta.

Depois de um ótimo fim-de-semana com minha mulher em Luxemburgo, combinamos que, na segunda-feira, 17 de janeiro de 2005, ela voltaria para Paris, onde estava fazendo um curso, e eu seguiria só, em busca do gnomo. Não que minha mulher não goste de cerveja ou de visitar cervejarias, pelo contrário, já fomos juntos à Heineken, à Pilsner Urquell, à Cantillon, à Duvel, à Guinness, à Carlsberg, dentre outras, mas algo me dizia que, desta vez, eu deveria mesmo é ir sozinho Acertei. Chegar, sem carro, à fábrica da La Chouffe, localizada nas florestas das Ardennes não foi nada fácil. Peguei trem para Gouvy, de onde esperava pegar um táxi até Achouffe. Chegando a Gouvy, descobri que não havia táxi para Achouffe, mas apenas para Houffalize. Descubro também que o frio é de 0 grau.

Pedi o táxi, para logo descobrir que este custaria 50 euros. Cancelo o táxi e pego ônibus até Houfallize. Salto no meio da estrada, literalmente no cruzamento. Vou andando e pego uma estrada vicinal. Com o nevoeiro intenso, só vejo uns 10 metros à minha frente num frio de rachar. Uma placa me indica: 4 quilômetros para o Vale das Fadas. É que esta região, então descubro, é conhecida por ser uma espécie de Visconde de Mauá belga, daí as fadas e os chouffes que, neste dia, não deram as caras, cochilando que ficaram no conforto de seus cogumelos. Fiz contas mentais para distrair-me, calculei quantos passos teria que dar para cobrir um quilômetro, mas me confundia sempre e recomeçava do zero. Mas nisso, ia andando e sempre pensando “Ufa, ainda bem que a Lica não veio…”. Chego a Mont – tudo muito rural, não há viv’alma. Nem vila ou aldeia é, apenas uma fazenda aqui, outra acolá. Uma vaca que pasce no frio pára e me examina atenta. Com certeza, há mais delas do que gente por aqui. Adiante, distingo dois cavalos na neblina, que também me examinam curiosos, o que mostra como deve ser raro gente andando por aqui. Dois carros passam, indiferentes ao meu polegar. Depois, porém, um terceiro pára. Mas eu já estava chegando! Já vira a cervejaria do alto, ó glória!

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Leia, no próximo post — o qual será publicado amanhã — a segunda e última parte dessa aventura cervejeira.



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