Em busca do duende Chouffe – Parte 1

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O texto abaixo foi enviado por Evandro Domingues, fiel leitor do BREJAS e, como nós, fascinado por cervejas e viagens. Domingues conta a peregrinação que fez, na Bélgica, em busca de uma das suas brejas prediletas. Boa leitura — e boa “viagem”!

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Quando fundaram, por hobby, a cervejaria belga d’Achouffe em 1982, os cunhados Pierre Gobron e Christian Bauweraerts não tinham ambições além do entretenimento. Dois anos depois a coisa ficou mais séria, e Gobron decidiu abandonar seu emprego para se concentrar apenas na cervejaria, o mesmo fazendo Bauweraerts um pouco depois. Eles sabiam o que faziam. La Chouffe (8%), o carro-chefe da casa, é uma cerveja não-filtrada, turva, que passa por uma refermentação na garrafa e no barril. Bastante frutada e lupulada, é uma cerveja espetacular.

Antes de prosseguir: a cerveja se chama La Chouffe; a cervejaria, Brasserie d’Achouffe; a cidade, Achouffe, e o duende que deu origem a tudo se chama… Chouffe. O que veio primeiro? Naturalmente, o nome do malicioso anãozinho que, abundante nas florestas das Ardennes, emprestou o nome à pequenina vila. O nome da cerveja nada mais é que um trocadilho com o nome da vila. Entenderam? Achouffe! Saúde!

Não me lembrava quando ou como eu sucumbira aos feitiços do duende. Recorrendo a velhos diários, consigo localizar com precisão o dia em que tomei a cerveja pela vez primeira: 19 de julho de 1998, no Café Belgique, em Amsterdam. Depois de tomar uma La Trappe, pedi, aceitando sugestão do menu, uma das “Belgian favorites” e assim a descrevi: “fuzzy, strong, delicious”. Foi paixão ao primeiro gole. Paixão fortalecida nesta mesma viagem, quando segui para Bélgica, e cinco anos depois, quando, em Bruxelas, no Bier Circus, sem dúvida um dos meus bares mais queridos e onde quero que repouse ao menos um punhado das minhas cinzas, sempre terminava ou iniciava minhas descobertas por uma La Chouffe.

Mas foi só em 2005, na minha terceira visita à Bélgica, que encetei uma peregrinação à fábrica do duende. Visitar fábricas de cervejas que amamos é um dever como o que os muçulmanos têm em relação a Meca: pelo menos uma vez na vida, devemos ir lá, conhecer de perto, sentir o ambiente, aspirar os cheiros e, claro, beber da cerveja fresca, direto da teta.

Depois de um ótimo fim-de-semana com minha mulher em Luxemburgo, combinamos que, na segunda-feira, 17 de janeiro de 2005, ela voltaria para Paris, onde estava fazendo um curso, e eu seguiria só, em busca do gnomo. Não que minha mulher não goste de cerveja ou de visitar cervejarias, pelo contrário, já fomos juntos à Heineken, à Pilsner Urquell, à Cantillon, à Duvel, à Guinness, à Carlsberg, dentre outras, mas algo me dizia que, desta vez, eu deveria mesmo é ir sozinho Acertei. Chegar, sem carro, à fábrica da La Chouffe, localizada nas florestas das Ardennes não foi nada fácil. Peguei trem para Gouvy, de onde esperava pegar um táxi até Achouffe. Chegando a Gouvy, descobri que não havia táxi para Achouffe, mas apenas para Houffalize. Descubro também que o frio é de 0 grau.

Pedi o táxi, para logo descobrir que este custaria 50 euros. Cancelo o táxi e pego ônibus até Houfallize. Salto no meio da estrada, literalmente no cruzamento. Vou andando e pego uma estrada vicinal. Com o nevoeiro intenso, só vejo uns 10 metros à minha frente num frio de rachar. Uma placa me indica: 4 quilômetros para o Vale das Fadas. É que esta região, então descubro, é conhecida por ser uma espécie de Visconde de Mauá belga, daí as fadas e os chouffes que, neste dia, não deram as caras, cochilando que ficaram no conforto de seus cogumelos. Fiz contas mentais para distrair-me, calculei quantos passos teria que dar para cobrir um quilômetro, mas me confundia sempre e recomeçava do zero. Mas nisso, ia andando e sempre pensando “Ufa, ainda bem que a Lica não veio…”. Chego a Mont – tudo muito rural, não há viv’alma. Nem vila ou aldeia é, apenas uma fazenda aqui, outra acolá. Uma vaca que pasce no frio pára e me examina atenta. Com certeza, há mais delas do que gente por aqui. Adiante, distingo dois cavalos na neblina, que também me examinam curiosos, o que mostra como deve ser raro gente andando por aqui. Dois carros passam, indiferentes ao meu polegar. Depois, porém, um terceiro pára. Mas eu já estava chegando! Já vira a cervejaria do alto, ó glória!

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Leia, no próximo post — o qual será publicado amanhã — a segunda e última parte dessa aventura cervejeira.

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